quinta-feira, 7 de outubro de 2010

É Preciso Uma Introspecção Política


Estamos, mais uma vez, diante do processo mais democrático que pode existir numa sociedade democrática representativa. Verdadeiramente – e não por falácia – temos um rico e imenso poder em nossas mãos. Fico demasiadamente triste ao saber que tal poder está alienado e engessado pelo pensamento absoluto em que pensar a política (quer nas conjunturas municipais, estaduais e nacional) é coisa de intelectual ou de “quem não tem nada a fazer”. Sei que a direita conservadora, através de sua práxis política, ajudou, e muito, o constructo deste pensamento; isso ajudava na manutenção do status quo político de suas bases, afastando o interesse público de seus reais interesses: pessoais e inalienáveis. Esse afastamento político faz com que se prolifere as práticas de corrupção e descaso que arruínam nosso país. Segundo estudos da ONU (Organização das Nações Unidas), se o Brasil reduzisse em apenas 50% a sua corrupção, teríamos a mesma estrutura em saúde e educação que os países de primeiro mundo. Como foi mensurado, não sei. Talvez somando os montantes descobertos pelas Polícias, Ministério Público e Controladorias Gerais, ao longo destas últimas duas décadas.

Há quem diga que a situação política que vivemos seja fruto de nossa própria natureza humana: corrompida, aproveitando-se das brechas situacionais para usurpar interesses próprios. Há fundo de verdade nisso, e talvez seja a explicação última e componente sine qua non do arcabouço explicativo holístico para tais práticas. Quando falo que “é preciso uma introspecção política”, não me refiro apenas a uma mudança de estrutura política nos âmbitos representativos de poder, mas também de uma mudança de estrutura do pensamento e, consequentemente, comportamental, enquanto sujeitos políticos. Devemos nos reconhecer nas ações políticas que são discutidas e votadas nas Casas Democráticas de nossa nação; saber que verdadeiramente não há distâncias, como se as decisões políticas interferissem na vida de seres alienígenas e não à nossa. A Lei da “Ficha Limpa”, por exemplo, deveria ser vista como um despertar da população para o tamanho do poder que temos em nossas mãos; de mostrar que é sim possível mudanças partidas de dentro da sociedade organizada; que mudanças significativas na estrutura social, político e econômico são viáveis, desde que haja o auto-reconhecimento de boa parte da sociedade – para não ser utópico em dizer toda sociedade – da influência que seus pensamentos e atitudes podem fazer. O “estrago” seria grande! Refiro-me ao “estrago” nos interesses pseudo-políticos dos maus representantes.

Entendo que uma possível organização social em massa não se dá de forma pura, ou seja, sem interferências ideológicas e doutrinárias, pois como já bem disse Bakhtin “um produto ideológico faz parte de uma realidade (natural ou social) [...] tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo” (Bakhtin, 1997). Muitos, principalmente os ideólogos de esquerda – que discutem e labutam há muito nas causas sociais – veriam como uma oportunidade ímpar na história (mais uma!), para propagar suas doutrinas, e incutir na mente daqueles que não se reconhecem de esquerda que, mesmo sem querer, defendem os mesmos ideais e projetos. Isso seria um verdadeiro “balde de água fria” na continuidade da luta social civil organizada, tendo em vista que, quase que em absoluto, a população brasileira é politicamente tradicional, conservadora, tendo, às vezes, ojeriza pelo pensamento de esquerda (refiro-me à esquerda verdadeira, e não a uma Terceira Via, adotado por FHC e continuado por LULA). Basta relembrarmos a Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, ocorrido em março de 1964, onde estima-se ter reunido cerca de 500 mil pessoas, em detrimento à Marcha dos Cem Mil que militavam contra a ditadura. De lá para cá pouca coisa mudou no perfil político brasileiro. Mudam-se as gerações e continua impregnado na cultura política brasileira o mesmo conservadorismo – senão pior.

Mudar o pensamento político dos brasileiros não significa necessariamente deixar o conservadorismo e aderir aos ideais de esquerda. Quando a sociedade passa a se interessar e participar dos processos políticos de seu município, e/ou estado, e/ou nação, não importa a bandeira que esteja no poder (se de Direita, Centro ou Esquerda - isto é, a velha pseudo-esquerda brasileira que tanto conhecemos). Todos eles passarão a ter maior cuidado nos gastos públicos, serão mais rigorosos em casos de corrupção, em casos de projetos de leis mais delicados – que vão de encontro ao pensamento cultural e religioso da sociedade, bem como à vida econômica dos brasileiros – passarão a fazer mais plebiscitos, consultando e não mais desrespeitando a soberania popular. A mesma realidade se aplicaria às questões sócio-ambientais, onde possivelmente os interesses de pequenas comunidades não seriam tragados pelos interesses do mercado imobiliário e do grande capital, que enxotam populações tradicionais de suas regiões, esgarçando raízes históricas, culturais, sentimentais e naturais para atender aos interesses fúteis dos novos burgueses, que surgem como beneficiários e resultados de uma educação diferenciada da grande maioria dos brasileiros.

Destarte, não importaria tanto um welfare state ou um laissez-faire. De uma forma ou de outra, com a participação e interesse direto da sociedade (não estou fazendo alusão a uma democracia direta, onde acho pura quimera), as coisas andariam dentro dos conformes – dentro de seus respectivos modelos políticos e econômicos, óbvio. Todos têm a contribuir, desde que haja participação da sociedade civil organizada no controle dos gastos e nos acordos licitatórios realizados pelos governantes. Podem até pensar que estou sendo pragmático ao extremo, sem firmeza ideológica, mas tenho percebido que muitos intelectuais da política pensam-na sobejamente como uma atmosfera meramente ideológica, não havendo espaço para a prática, que, ao meu ver, é o que verdadeiramente faz a diferença no meio social. Muitas vezes sou levado a crer que em uma defesa político-ideológica, em confrontação à outra(s), há muita vaidade, mas não uma vaidade pura e simples; refiro-me a uma vaidade extremada, que cega ao ponto de não enxergar propostas positivas em outros campos ideológicos. Isso (a vaidade), ao meu ver, explica, em boa parte, a grande diversidade de partidos políticos de esquerda – sem levar em conta seus interesses políticos (desta vez entendam "políticos" pejorativamente). No frigir dos ovos, todos têm propostas e anseios em comum, mas distanciam-se pelo orgulho doentio em querer que seus pontos de vistas superem aos dos demais. É como se seus interesses egóicos sobressaíssem em detrimento aos interesses sociais. Nada mais além do que fruto de uma esquerda acadêmica, teórica, aprendida – e convencida – nas cadeiras escolares, e não na prática pela defesa dos interesses dos menos favorecidos, vítimas da selvageria capitalista que esgarçam qualquer tipo de esperança que possa florescer em seus corações. Enfim, um simulacro!

(Re)Pensar a política intimamente é mais do que um dever cívico: é um dever moral. Não há demérito algum em refleti-la de forma não viciada, objetiva, imparcial, tendo como único escopo o bem-estar de todos. Parafraseando a bíblia: quem tem ouvidos, ouça!