terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Sobre a Remonstrância.



Trecho do livro Graça, Fé, Livre-arbítrio. De Robert E. Picirilli.

Conseqüentemente, em 1610, com as tensões ainda em crescimento, os seguidores de Arminius apresentaram uma petição aos Estados, chamado de “Remonstrância” (por isso que aqueles que a apoiaram foram chamados “Remonstrantes” e os calvinistas que se opuseram “Contra-Remonstrantes”). Entre os líderes do lado arminiano estavam Uitenbogaert, um estudioso chamado Simon Episcopius, e um advogado influente chamado Hugo Grotius; Oldenbarnevelt deu apoio a eles.

A Remonstrância expressou os principais pontos dos arminianos sucintamente em cinco artigos. Estes são como segue:

Art. 1. Que Deus, por um eterno e imutável plano em Jesus Cristo, seu Filho, antes que fossem postos os fundamentos do mundo, determinou salvar, de entre a raça humana que tinha caído no pecado – em Cristo, por causa de Cristo e através de Cristo – aqueles que, pela graça do Santo Espírito, crerem neste seu Filho e que, pela mesma graça, perseverarem na mesma fé e obediência de fé até o fim; e, por outro lado, deixar sob o pecado e a ira os costumazes e descrentes, condenando-os como alheios a Cristo.

Este artigo apresenta o ponto principal em debate. Ele aceita a predestinação como incluindo tanto a eleição para salvação quanto a reprovação para condenação. Mas ele coloca ambos os decretos após a queda voluntária (não necessária) do homem no pecado, e faz ambos os decretos condicionais à respectiva fé ou incredulidade dos indivíduos que são os objetos da eleição ou reprovação. Este está em oposição à concepção calvinista da eleição incondicional.

Art. 2. Que, em concordância com isso, Jesus Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos e cada um dos homens, de modo que obteve para todos, por sua morte na cruz, reconciliação e remissão dos pecados; contudo, de tal modo que ninguém é participante desta remissão senão os crentes.

Este artigo enfatiza a expiação ilimitada ou universal, e todavia deixa claro que nem todos são na verdade salvos por esta expiação; somente os crentes experimentam seus efeitos redentores. Isto se opõe à concepção calvinista de que a expiação proveu redenção somente aos eleitos.

Art. 3. Que o homem não possui por si mesmo graça salvadora, nem as obras de sua própria vontade, de modo que, em seu estado de apostasia e pecado, para si mesmo e por si mesmo, não pode pensar nada que seja bom – nada, a saber, que seja verdadeiramente bom, tal como a fé que salva antes de qualquer outra coisa. Mas que é necessário que, por Deus em Cristo e através de seu Santo Espírito, seja gerado de novo e renovado em entendimento, afeições e vontade e em todas as suas faculdades, para que seja capacitado a entender, pensar, querer e praticar o que é verdadeiramente bom.

Este artigo enfatiza que tudo envolvido tanto na salvação como na vida cristã é pela graça de Deus. Nem mesmo o livre-arbítrio do homem pode iniciar uma resposta positiva a Deus à parte da graça capacitante. Assim até a fé salvadora não é efetuada pelo homem “de si mesmo.” Os arminianos foram sempre acusados de atribuir muito ao homem e então depreciar a graça. Este artigo tinha o propósito de anular essa falsa acusação e mostrar que eles estavam de acordo com seus oponentes ao atribuir todo o bem à graça de Deus.

Art. 4. Que esta graça de Deus é o começo, a continuação e o fim de todo o bem; de modo que nem mesmo o homem regenerado pode pensar, querer ou praticar qualquer bem, nem resistir a qualquer tentação para o mal sem a graça precedente (ou preveniente) que desperta, assiste e coopera. De modo que todas as obras boas e todos os movimentos para o bem, que podem ser concebidos em pensamento, devem ser atribuídos à graça de Deus em Cristo. Mas, quanto ao modo de operação, a graça não é irresistível, porque está escrito de muitos que eles resistiram ao Espírito Santo.

O quarto artigo continua a ênfase do terceiro, mas acrescenta uma importante qualificação: a graça de Deus opera de tal modo que o homem pode de forma sucedida resisti-la. Ninguém é superada por ela, a liberdade do homem não é tirada por sua operação. Isto foi para opor a concepção calvinista de que a graça salvadora é irresistível.

Art. 5. Que aqueles que são enxertados em Cristo por uma verdadeira fé, e que assim foram feitos participantes de seu vivificante Espírito, são abundantemente dotados de poder para lutar contra Satã, o pecado, o mundo e sua própria carne, e de ganhar a vitória; sempre – bem entendido – com o auxílio da graça do Espírito Santo, com a assistência de Jesus Cristo em todas as suas tentações, através de seu Espírito; o qual estende para eles suas mãos e (tão somente sob a condição de que eles estejam preparados para a luta, que peçam seu auxílio e não deixar de ajudar-se a si mesmos) os impele e sustenta, de modo que, por nenhum engano ou violência de Satã, sejam transviados ou tirados das mãos de Cristo. Mas quanto à questão se eles não são capazes de, por preguiça e negligência, esquecer o início de sua vida em Cristo e de novamente abraçar o presente mundo, de modo a se afastarem da santa doutrina que uma vez lhes foi entregue, de perder a sua boa consciência e de negligenciar a graça – isto deve ser assunto de uma pesquisa mais acurada nas Santas Escrituras antes que possamos ensiná-lo com inteira segurança.[21]

Este artigo final é o maior. Ele mostra que os primeiros arminianos, embora não tinham completamente se decidido, estavam abertos à opinião de que alguém pode ser perdido após ter sido salvo. Esta não foi uma das questões chaves na controvérsia, embora ela tenha sido levantada. A declaração representa um sentimento cauteloso e prematuro sobre o assunto. Posteriormente os arminianos viriam a expressar esta opinião sem tal hesitação, se colocando em oposição à crença calvinista na necessária perseverança.



MINHAS CONCLUSÕES EM SUSCINTAS PALAVRAS:

Art. 1º - Concordo plenamente.
Art. 2º - Concordo “em gênero número e grau!”
Art. 3º - Creio que o “livre-arbítrio” não pode ser interpretado como um “mal-arbítrio”, ou seja, como uma incapacidade de se pensar qualquer tipo de bem. Se assim o fosse, filhos incrédulos ao evangelho não pensariam bem de seus pais.
Art. 4º - Somente os bens praticados que forem persuadidos pelo Espírito Santo. Exemplo: se alguém grita com você, você pode: a) não revidar pois simplesmente acha desnecessário (sabedoria humanista); ou b) não revidar, pois essa não seria uma atitude praticada por Jesus, se estivesse em seu lugar (sabedoria divina). Se diante da circunstância a sua opção for “b”, podemos dizer que foi ação do Espírito Santo que “convenceu do mal”. Portanto, nem todas as obras boas e todos os movimentos para o bem, que podem ser concebidos em pensamento, são atribuídas à graça de Deus em Cristo.
Art. 5º - concordo quanto à primeira parte. Quanto à última parte do artigo, é bem verdade que há trechos na bíblia que nos direcionam à doutrina da “perda da salvação” (ver Apóstolo João 15.6). Mas prefiro as outras palavras de Jesus quando diz: “Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (João 6.37).