“Um episódio não é a
consequência inevitável de uma ação precedente, nem a causa do
que virá em seguida” (Bauman in Kundera, 2004, p. 70)*.
Esta frase me parece por
demais generalizante. Não creio que os fatos sejam dissociáveis de
experiências de outrora. Há, óbvio, no cotidiano, ações – ou
mesmo discursos – não concatenados com fatos precedentes, por mais
que isso possa contrariar os materialistas históricos e analistas de
discursos. Porém, generalizar é um erro gritante.
Creio que somos aquilo
que construímos, mesmo à contragosto e longe do que idealizamos
para nós. Nossos atos dizem mais de nós àquilo que pensamos de
nós. Somos nossos rastros nos vários terrenos pelos quais passamos.
Não compactuo com a ideia de que somos o “agora”, e que as
experiências passadas construiu-nos; não dissocio o “fomos” do
“somos”, apenas somos. Alguns hábitos podem ter
sido deixados para trás, pensamentos à respeito de assuntos
pontuais e exclusivos podem ter sido substituídos pela posição
antagônica – ou mesmo radicalizados –, e quiçá a própria
essência do caráter tenha sido significativamente transformada.
Porém, ainda assim, somos.
Somos as várias máscaras
que vestimos ao longo da vida; elas podem ser exteriores a nós,
frutos da determinação sócio-cultural, ou mesmo da desigual luta
contra essa macrodeterminação, afinal de contas somos seres
históricos – locais, finitos e temporais – mas também podem ser
máscaras construídas, como uma maneira de encarar a realidade.
Destarte, os episódios
são o terreno que calçam nossa existência. Muitos são construídos
(forjados), outros nos surgem de supetão e exigem de nós uma
resposta imediata, que certamente virá de acordo com as experiências
construídas, ou seja, daquilo que fomos lá trás e que novamente
seremos no presente – mesmo que de maneira diferente de outrora,
levando em conta as lições aprendidas.
* Bauman, Zygmunt. Amor líquido - sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2004.
* Bauman, Zygmunt. Amor líquido - sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 2004.
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