v. 15 – “Senhor,
dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, nem venha aqui
tirá-la”.
De
imediato, aquela mulher reconheceu que as suas tradições não
preenchiam o vazio de sua alma; era-lhe insuficiente demais, não
serviam como alicerce para a sua vivência na terra. A expressão
“nem venha aqui tirá-la” significa, em outras palavras:
“para que eu não mais recorra as minhas tradições”.
É
bem verdade que o Ser humano procura razões para viver e se
orgulhar; o Ser humano é um ser local e ideológico, costuma se
orgulhar de suas raízes, e busca alguma ideologia para se
identificar. Como já bem disse um cantor e compositor brasileiro:
“ideologia, eu quero uma pra viver”. Mas a mulher
samaritana teve uma atitude louvável: reconheceu a insuficiência de
suas tradições, raízes, e a ideologia recorrente na Samaria.
Talvez naquele momento ela tenha desabafado algo que a deixava
engasgada e viu a pessoa certa e o momento certo para dizer que
aquelas tradições não lhe representava.
Fico
a imaginar quantos e quantas estão presos(as) às mais diversas
tradições, o mais fundo de suas consciências os acusam que suas
tradições e ideologias não os levam a canto algum, não preenchem
seus vazios existenciais, enfim, lhes são insuficientes.
Não
é novidade alguma que o cristão deve lutar contra a tríade
maligna: satanás, carne, e o mundo. Destes, o mundo faz a parte
dele pondo em nossa frente um “cardápio” imenso de ideologias,
ou seja, motivos para se viver. O encurtamento das distâncias
provocada pela internet, só fez aumentar ainda mais esse “cardápio”,
e como consequência, o vazio. Muitos passam a se identificar com
histórias que não são suas, com raízes que nunca lhes pertenceu,
e com ideologias que nada tem a ver com a sua história de vida. O
vazio humano é tamanho que chegam mesmo a abraçar, “de corpo e
alma”, estilos de vida e causas, que nunca pertenceu ao seu
território.
Óbvio,
não era o caso da mulher samaritana, ela se orgulhava das tradições
criadas em sua própria terra. Porém, todo tipo de tradição –
seja ela “de dentro” ou “de fora” – que não é
fundamentada em Cristo, não tem o poder de preencher a alma com
satisfação. Um dia tornará a ter sede.
vs.
16 a 18
– Ao ler esse trecho, nada tira de minha cabeça que Jesus estava
testando o grau de sinceridade daquela mulher. Percebam que Jesus
pede para que ela chame seu marido, logo após ela pedir “a água
que não mais dá sede”. Embora sendo Deus, e conhecido a
sinceridade interior da mulher ao pedir desta água, Jesus queria
mais uma prova de sinceridade e pede para ela falar de algo que traz
constrangimento à vida de qualquer mulher de sua época – e a
muitas de nossos dias! Ela poderia, movida pelo constrangimento, ter
mentido sobre sua situação matrimonial, como tenho visto muitas
mulheres fazerem em nossos dias: vivem amasiadas com algum homem, tem
toda uma vivência de casados, e os chamam de maridos ou
“namoridos”.
Porém, devo destacar que a aliança do casamento, firmada na
presença de Deus e da sociedade, tem um
caráter mais do que simbólico para Deus: é
também uma aliança espiritual.
Perceba que Jesus reconhece isso ao dizer: “...e
o que agora tens não
é teu marido...”.
Jesus
deixa bem claro que aquele tipo de relação não era uma casamento
de fato!
Sinto
muito se o que está sendo dito agora está trazendo constrangimento
a alguém, mas a verdade precisa ser dita (com
zelo e amor) e
que sirva de alerta para muitos e muitas, para que corrijam suas
relações amorosas diante de Deus. Pode até haver o amor sincero
entre vocês, porém, para Deus, isso não é suficiente para que se
declarem casados.
Abro parêntese: “A igreja é um local de renovação de esperanças,
mas também é de exortação”. Fecho o parêntese.
vs.
20 e 21
– A
mulher ainda estava com a cabeça movida pelas tradições. Ela não
mais tinha dúvida de que Jesus era um profeta (ver v. 19),
acreditava em suas palavras, porém, a esfera espiritual, para ela,
ainda estava atrelada a algum tipo de tradição. Ela ainda
acreditava que existia um local certo para se adorar: “Nossos
pais adoraram neste monte, e vós dizeis que em Jerusalém é o lugar
onde se deve adorar”. Antes,
um adendo: se perceberem a narrativa do diálogo entre Jesus e a
mulher, em nenhum momento se vê Jesus falando que “em
Jerusalém é o lugar onde se deve adorar”. Além
de o julgar pela região onde habitava (Judeia), quis colocar
palavras na boca de Jesus. Ruídos de comunicação acontecem a todo
instante.
Muitos
agem como essa mulher: ainda acreditam que a igreja A ou B é a
certa, que Deus só recebe a adoração e escuta seus clamores
naquela denominação ou templo. É um tipo de religiosidade, algo
que deve ser banido da mente de muitas pessoas. E foi nesse intuito
de banir essa percepção que Jesus declara: “Mulher,
crê-me, a hora vem, em que nem neste monte, nem em Jerusalém
adorareis o Pai”.
Jesus deixa claro que a adoração não é amarrada a algum tipo de
local,
tradição.
A verdadeira
adoração
é algo que vem de dentro, e isso
fica evidenciado nos versículos 23 e 24. Basta nos lembrarmos da
silenciosa
oração
de Ana (1Sm
1. 13),
que pediu a Deus um filho, e pediu no íntimo de seu Ser. Quando nós
só recorremos a Deus – e não para outros deuses simultaneamente,
como faz a igreja católica
–
para a solução de nossos problemas, isso é uma forma de adorá-Lo,
pois reconhecemos a suficiência de seu poder, misericórdia
e
benignidade para nos ajudar.
v.
22
– Talvez
achemos que Jesus esteja sendo territorialista ao declarar isso.
Porém, não
se trata de sectarismo
algum. Conforme diz o estudioso Norman Champlin, a expressão “vós”
se refere tanto aos samaritanos como aos judeus que não o
reconheciam como Deus; e “nós”, aos cristãos.
E
ao dizer que “a
salvação vem dos judeus”,
Jesus destaca a função histórica de Israel e não ao Israel
espiritual.
vs.
23 e 24
– Uma das mais famosas declarações bíblicas em que vemos
ser cantadas em diversas canções. “Em
espírito, em verdade, te adoramos, te adoramos”.
Isso
manifesta o caráter interior da adoração. Os judeus costumavam (e
ainda costumam) adorar a Deus nas praças, no muro das lamentações,
fazendo vãs repetições e gritando suplicas a YHWH. Muitas igrejas
que se dizem cristãs seguem o mesmo erro, costumam adorar e clamar
aos
gritos e com
manifestações
corporais exóticas.
Deus
não procura performances
da adoração. Ele quer que o adoremos em
espírito
– que o adore com fé, creia que Ele é Deus e galardoar dos que o
buscam (Hb. 11. 6) – e em
verdade
– sendo seu amigo, fazendo o que Ele manda (Jo. 15.14).
v.
25
– Até aquele momento a mulher acreditava
que ele era um profeta (v. 19), mas jamais poderia imaginar que
estava falando com o próprio Cristo (que significa Messias), aquele
que viria libertar judeus e samaritanos das garras do pecado, de
satanás, e da morte eterna – e quero crer que se houvesse
aceitação e reconhecimento por parte dos judeus de que ele era o
messias, os libertaria também do poder dos romanos, já
que essa era a maior esperança dos judeus, um libertador político.
vs.
26
– Jesus declara ser este messias. Fico imaginando a mescla de
susto e surpresa que aquela mulher teve. Mas o que mais me chama a
atenção é o caráter pessoal de Deus: “...
eu que falo contigo”.
Nosso Deus é um Deus pessoal. Como bem disse Ed René Kivitz, em seu
livro “O livro mais mal-humorado da bíblia” (fazendo referência
ao realismo de Eclesiastes):
“Na
tradição espiritual judaica, Deus não se apresenta como 'Deus dos rios, sol e vento', mas sim como 'Deus de Abraão, Deus de Isaque,
e Deus de Jacó'. Na hora de se identificar ele escolheu citar
nomes de pessoas e não de objetos naturais” (p.
8, 2014).
Pode
nos parecer estranho, mas como pode o criador do universo (com as
suas bilhões de galáxias), dos céus, da terra, do mar e de tudo o
que neles há, falar comigo? Eu não sou nada perante o
universo. O ínfimo dos ínfimos! Mas Ele não apenas fala, como
melhor que isso: tem a intenção de iniciar um diálogo conosco.
Foi
o que vimos acontecer com a mulher samaritana (v. 7) e em tantos
outros exemplos bíblicos. Portanto, busque-o, mas busque-o de todo
o coração, pois o acharão se o buscardes de todo o coração (Jr.
29. 13).
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